sexta-feira, 10 de setembro de 2010

As dores do meu parto

O relato do meu parto foi feito em dezembro de 2009, um pouco antes do aniversário de um ano de minha filha. Foi muito difícil escrever sobre essa vivência e demorei muito para conseguir fazê-lo. Hoje decidi postar esse relato porque tenho acompanhado na lista doulasbrasil alguns depoimentos que mostram exatamente isso: mulheres tentando parir seus filhos e pessoas fazendo de tudo para atrapalhar.  E para ilustrar essa postagem coloquei uma imagem pela qual sou apaixonada. A amamentação foi o que, aos poucos, me relembrou a magia de ser mãe e mulher!

"Laís querida, obrigada por me transformar na pessoa que sou hoje e me motivar a ser cada dia melhor. Te amo muito!"



Às vésperas do aniversário de um ano de minha filha, decidi escrever sobre esse momento tão significativo de nossas vidas e que ainda me provoca lágrimas nos olhos: o parto.

Desde que descobri que estava grávida decidi que queria parto normal. Uma decisão que fugia totalmente ao meu ambiente e ciclo de convívio. Nascida de cersariana, beneficiária de um plano de saúde particular e cercada de mulheres que nada sabem sobre dar a luz a um filho, iniciei uma busca, quase uma investigação, sobre o que é o parto normal (natural, humanizado, ativo.....) e o que pode ser feito para favorecer esse acontecimento.

..... e então se transcorreram os nove meses mais maravilhosos de minha vida....

Minha gestação foi o que se considera “tranqüila”. Aos poucos fui incorporando à minha rotina aquilo que ia descobrindo ser favorável ao parto normal. Comecei com as aulas de yoga para gestante e estes eram meus momentos preferidos, onde eu tinha o apoio e a orientação que queria , onde era encorajada a acreditar na minha capacidade de mulher de parir.

Li alguns livros sobre o tema e visitei alguns sites, poucos na verdade e superficialmente, porque nunca fui muito paciente com a internet.

A cada consulta com minha obstetra conversava sobre suas convicções de parto normal, tirava algumas dúvidas e falava sobre como eu queria que fosse o meu parto. Ela via que eu estava informada e bem decidida, e se dizia favorável ao parto normal sem muitas intervenções e que eu era uma gestante tranqüila (na verdade um casal grávido tranqüilo, porque o Márcio, meu marido, sempre me acompanhava).

Eu estava realmente muito feliz com a minha gestação e com a minha decisão. Acredito que a oportunidade de parir é uma benção de Deus a nós mulheres e que a natureza não iria errar tanto em nos fazer sofrer para poder gerarmos uma vida. Realmente acredito que tudo depende da forma como você encara as coisas. Lembro que minha professora de yoga fazia questão de dizer que “não necessariamente há dor durante uma contração e caso haja que ela seja bem vinda pois significa que seu bebê está cada vez mais perto de você”.

Curti muito minha gestação e conversava muito com minha filha, falava a ela das minhas intenções de parto normal e de como ela seria bem recebida quando decidisse chegar. Acredito que para o bebê o nascimento é um momento muito difícil, infinitamente mais difícil do que para nós, mães que estamos dando à luz. Isso, não apenas no que se refere ao aspecto físico, mas e principalmente, no que se refere ao aspecto espiritual daquela nova vida. Isso também me levou a querer não apenas um parto normal, mas que minha filha pudesse ser recebida e tocada por nós (pais) quando nascesse, que não fosse tudo feito de forma mecânica e invasiva.....

Bem, então quando eu estava com 38 semanas minha médica soltou um “se você fosse fazer uma cesariana já poderíamos marcar para esta semana”. Aquilo soou muito mal aos meus ouvidos, mas..... tentei não dar importância. Ela sabia que eu QUERIA e (só queria) parto normal.

A partir deste momento todas as pessoas que te encontram já te olham com cara de “o que essa criatura faz com essa barriga deste tamanho?” Minha barriga estava muito grande, mas muito grande e eu tinha engordado apenas 11kg! Você já começa a se sentir muito grande, mas eu estava curtindo, ADORAVA e estava disposta a esperar o tempo que fosse necessário.

E foi necessário esperar bastante... Nas consultas, minha médica começou a dizer que o bebê estava encaixado mas não tinha descido, estava alto. Minha professora de yoga falava para eu conversar com minha filha e incentivá-la a descer e eu sempre fazia isso nos momentos de relaxamento, dizia que eu estava pronta para recebê-la.

Fechamos as 39 semanas e nada... tudo na mesma!

A esta altura minha obstetra cogitou a possibilidade de fazer uma cesária, eu perguntei por quê?? Eu estava ótima e o bebê também, tudo estava bem em todos os exames. Lembro dela perguntar porque eu não queria fazer cesariana, se tinha medo. Eu respondi que para mim o problema não era fazer uma cesariana, que não tinha medo de cirurgia. Para mim o problema era não fazer o parto normal, não passar por esse momento que eu considerava maravilhoso e único, algo só meu, que ninguém poderia vivenciar no meu lugar.

Bem, e nessa consulta ela viu que eu não era apenas mais uma querendo parto normal. Eu não estava muito disposta a negociar. Então ela disse que eu estava muito tranqüila e bem informada e que neste caso poderíamos esperar mais uma semana.

Fechamos 40 semanas e ...NADA....

Eu continuava ótima e o bebê também. A essa altura toda minha família e a do meu marido, que não moram em Curitiba, já estava aqui e acho que apenas isso me pressionava um pouco. Todas aquelas pessoas aqui, que vieram de tão longe, já estavam ha praticamente 10 dias e nem sinal de o bebê nascer.

Então tivemos uma consulta e a médica quis marcar a cesariana, e eu comecei a chorar, era uma quinta-feira. Acho que ela se impressionou com minha reação e também ficou emocionada, disse que então esperaríamos até a próxima terça-feira e aí, se não mudasse o cenário marcaríamos a cirurgia.

UFA!!! Ganhamos alguns dias!!!

Quando essa consulta terminou passei a viver uma constante espera. Esperava que a qualquer momento uma dor diferente viesse, que alguma coisa diferente escorresse entre minhas pernas, mas tudo era tão tranqüilo, tão normal.... nenhum desconforto a não ser o da pressão de ter que acontecer alguma coisa até terça-feira.

E quando amanheceu segunda-feira para minha surpresa não tinha sentido NADA de diferente. Chamei meu marido para conversar e disse que não queria marcar cesariana nenhuma, que sabíamos que nossa filha estava bem e que poderíamos esperar até 42 semanas. Pedi que ele ligasse para a médica e falasse que não iria marcar nada para terça-feira. Ele fez isso! Ela então pediu que mesmo não sendo para fazer a cirurgia fôssemos no hospital no dia seguinte para fazermos um exame mais detalhado do bebê.

Lembro de naquela segunda feira ter feito acupuntura e pedi ao meu acupunturista para apenas relaxar pois estava estressada com aquela pressão de tem que nascer.....

E então para minha surpresa após o almoço comecei a sentir uma coisa diferente. Pensei “hummm....isso está parecendo novo... nunca senti antes, então acho que pode ser um bom sinal”. Fiquei bem quieta, não falei para ninguém, mas pedi ao meu marido que não voltasse para o escritório e ficasse comigo. Durante a tarde aquilo, que não quero chamar de dor, pois para mim era algo tão desejado, começou a ficar mais forte e quando vinha tinha que ficar de pé e andar. Comentei então com meu marido, assim com muita naturalidade...”acho que comecei a sentir as tais contrações” e pedi que ele também ficasse bem quietinho. Toda a nossa família estava conosco e eu não queria criar falsas expectativas em ninguém.

Naquele dia todos tinham combinado de ir assistir ao Auto de Natal, uma encenação do nascimento de Jesus muito bonita, e então quando deu 19h meu marido foi levá-los e eu fiquei sozinha em casa. Nesta hora percebi que realmente o que eu sentia só podia ser contração. Quando aquilo vinha eu precisa para, me agachar e me concentrar totalmente, passou a ser muito intenso, e eu estava MARAVILHADA!!!!! Quando o Márcio chegou começamos a marcar os minutos e então vimos que elas estavam com intervalos regulares e rapidamente se intensificando.

Quando deu 21h30 ele falou “vamos para o hospital” eu disse que não, que iríamos bater lá e voltar eu estava bem ainda e a notícia que tinha era de que mulher em trabalho de parto urra de dor. Ele insistiu pois as contrações estavam de 7 em 7 minutos. Então tá, peguei minha bolsa (só a bolsa mesmo pois tinha certeza de que ia bater no hospital e voltar) e nesse meio tempo nossa família voltou e minha mãe foi conosco.

No carro eu pensava “ooobbbbaaaa a noite vai ser animada, finalmente chegou a hora”! Sabia que estava em trabalho de parto, mas estava bem e feliz, preparada para voltar para casa e encarar horas de caminhadas, respirações, duchas, massagens... tudo aquilo que sonhava fazer por mim e meu bebê.

Quando chegamos ao hospital o médico de plantão me olhou e disse para meu marido “acho que ela ainda não está em trabalho de parto, pois está caminhando e conversando normalmente, deve ser o que chamamos de falso trabalho de parto, mas vamos examinar”.

Para nossa surpresa eu estava com 5 de dilatação e ele disse para já ficar internada. Ligou para minha médica, o que era procedimento de rotina, e disse algo que ficou gravado em mim “mas o bebe ainda está alto”. Tudo bem, eu pensei, eu estou bem e agüento até ele descer.

O Márcio foi cuidar da papelada da internação e minha mãe ficou comigo. Sempre que vinham as contrações eu fazia as respirações que treinei nas aulas de yoga e estava bem tranqüila.

Então o Márcio chegou com a enfermeira e uma cadeira de rodas para subirmos ao centro obstétrico. “Para que essa cadeira?” eu pensei, e disse a ela que iria caminhando. Me sentia ótima, confiante, forte, disposta. Não é que eu não sentisse dor, é que eu estava tão feliz que queria participar ativamente de tudo.

Então subimos todos, a enfermeira, minha mãe, o Márcio e eu. Quando chegamos na porta do centro obstétrico a enfermeira disse que o Márcio não poderia entrar e eu fiquei irritadíssima pois o combinado era que ele entraria comigo. Eram 11h da noite, não tinha mais ninguém naquele hospital e ela veio com uma conversa de que a médica teria que autorizar porque a presença dele poderia constranger outras gestantes..... Ahhhh aí eu já me armei toda para a briga, mas antes que pudesse falar o Márcio percebeu tudo e falou para eu entrar que ele ligaria para a Dra e logo entraria.

Realmente esse pessoal de hospital não entende nada de parir um filho.... Todo o encanto e ternura deste momento começam a sumir quando você se depara com aquele ambiente hospitalar, aquela camisolinha ridícula que só mesmo com anestesia geral para você usar, e aquelas pessoas te olhando sem o menor acolhimento, querendo te dizer tudo o que você deve fazer, como se você fosse um ser sem vontade e sem desejos.

A partir daquele momento me deparei com a frieza com que o sistema de saúde brasileiro trata o nascimento de um filho e fiquei sozinha naquela sala horrível, com uma roupa ridícula e uma touca mais ridícula ainda. Mas tudo bem, eu pensei, minha querida professora de yoga tinha dito que isso iria acontecer: “Querida, esteja preparada para ficar sozinha” e então comecei a conversar com minha filha, caminhava e dizia a ela que viesse em paz pois a mamãe estava pronta para recebê-la, que tivesse coragem pois iríamos ajudá-la no que fosse preciso, que era hora de trabalharmos juntas! E assim fiquei até que apareceu uma enfermeira e perguntou se eu estava bem, disse que era melhor eu deitar....... Ai ai ai, elas realmente não conseguem nos ajudar muito!!!!

Pedi para pegar minha meia porque não ia sentar e o chão estava gelado para ficar andando com aquele sapatinho de TNT (ridículo!!!). Ela disse que não podia, eu insisti, ela disse que não podia... eu insisti DE NOVO. Então fomos até a salinha onde ficaram minhas roupas e pude ver minha mãe, o Márcio e a Dra conversando, ela tinha acabado de chegar. Dei um sorriso e sinalizei que estava tudo bem, e gritei que era para o Márcio entrar!!!

Quando eles chegaram à super sala de parto eu continuava andando e respirando, andando, respirando e conversando com minha filha.... já era quase meia noite e ela fez o exame de toque... 7cm de dilatação mas o bebê ainda estava alto!!!

Então ela sugeriu que eu fosse para a ducha, lá fomos nós. O Márcio ficou lá, o tempo todo comigo, foi bem relaxante e alivia muito a dor, mas teve uma hora que pensei “Meu Deus, quanta água, que desperdício..... acho que vou sair....” Aí logo a Dra chegou, então me sequei e me deitei de novo para mais um exame..... 8cm. Pedi a ela para andar mais um pouco, é extremamente doloroso ficar deitada ou parada, ela disse que tudo bem, a dilatação estava indo super bem, mas o bebê ainda estava alto e o trabalho de parto ainda poderia demorar umas 4h (isso para mim não era nenhum problema!!!).

Minha filha pode demorar o tanto que quiser, eu pensava, eu estou preparada! E ali ficamos eu e o Márcio, não tínhamos as músicas nem os óleos que eu havia escolhido, muito menos uma luz amena e um ambiente tranqüilo como imaginei, mas tudo bem, nossa filha estava chegando, nós estávamos juntos e bem, e isso fazia o momento mágico.

Lá vem a Dra de novo para fazer outro toque (para que tocar tanto, né?!?!), 9cm de dilatação só que a bolsa não estourou e o bebê continua alto. Ela então mede os batimentos cardíacos e dá baixo (não lembro quanto), mas eu estava tendo contração!!!! E lembro de ter lido que durante a contração o batimento do bebe diminui!!!! Poxa, será que ela não sabe disso!!! Então falei, e ela disse que estava muito baixo mesmo para ser durante uma contração e que minha filha deveria estar em sofrimento.... Mas insisti para ela medir de novo e é óbvio que ela mediu e deu normal!!!!!

Lembro de nesse momento ela começar a se dirigir mais ao Márcio para explicar o que estava acontecendo. Eu estava muito concentrada em minhas respirações e convicta de que tudo estava bem, era só deixar a natureza seguir seu fluxo. Mas ela veio com uma história de que a diferença entre a medição durante e fora de uma contração não poderia ser tão grande...... e que seria melhor fazer uma cesária.

Lembro que senti uma profunda frustração e me dei conta de que ela não tinha noção do que significava para mim aquele momento. Tá, eu falei, não dá para a gente tentar nada antes, eu não quero uma cesariana!!!! Dentro de mim algo dizia que a Laís (minha filha) estava bem, nós estávamos bem!!!!!.

Então ela quis fazer um outro toque, disse que já estava totalmente dilatada, o colo estava ótimo, que estava tocando na membrana e poderia até romper a bolsa... Só que enquanto ela me examinava e falava, na verdade ela já estava era rompendo a minha bolsa..... Fiquei muito chateada com aquilo, mas se era a forma encontrada para tentarmos evitar uma cirurgia tudo bem.

Bem, neste momento, comecei a sentir as verdadeiras dores do meu parto. Quando ela rompeu a bolsa, senti a dor de não ser respeitada. Não estava convencida de que aquele procedimento era necessário. Meu marido me chama de teimosa, mas eu tinha estudado e sentia que estava tudo bem. Poxa, a barriga é minha e o bebê está lá dentro, será que minha intuição não conta???. Não é que eu queira saber mais que a médica, mas eu também sei alguma coisa e confio nisso, mas isso não é levado em consideração e nem respeitado. Sabia que um parto deve ter o mínimo de intervenções possíveis e aquela era uma tremenda de uma intervenção!!! Romper a bolsa!!!!

E então, quando a bolsa é rompida o líquido está um pouco escuro, era mecônio, o bebê tinha feito cocô. Pronto, dá para imaginar como as coisas transcorreram a partir daí. A médica chamou meu marido, mostrou o líquido e disse que o bebê estava em sofrimento e precisávamos fazer uma cesária urgente!

Só um pouquinho doutora,eu ainda tive a capacidade de dizer, eu sei que o mecônio isoladamente não significa muita coisa e ainda existem graduações para essa tonalidade escura do líquido e pelo que eu posso ver ele não está tão escuro assim.

Nessa hora ela, a enfermeira que estava na sala e meu marido me olharam com uma cara assustada como se eu quisesse matar minha filha.... E aí aquelas dores (da falta de respeito) começaram a ficar cada vez mais intensas e se somaram a outra dor, a da frustração. A Dra se defendeu, disse que o que eu falei não era bem assim e que precisávamos fazer a cirurgia urgente.... Meu marido veio para perto de mim e me disse que eu tinha tentado tudo que podia, mas as coisas aconteceram assim, agora era hora de aceitar e confiar na médica.

Nossa, quanta, mas quanta dor eu senti nessa hora. Uma dor desesperadora!!! Me sentia impotente, desrespeitada, derrotada, incapaz, comecei a chorar sem parar, me sentia uma fracassada!!! Eles quiseram me levar deitada para a sala de cirurgia.... OPA... sai pra lá que eu não estou doente, eu pensei. Me levantei e quis ir andando, e chorando, chorando muito!!! Meu marido estava comigo e só pedia para eu ficar calma, que eu tinha feito tudo o que podia, que eu estava de parabéns, que era para eu ficar feliz pois nossa filha estava chegando....

Como eu gostaria de me sentir assim, mas infelizmente não era isso que sentia! Sentia que me roubavam uma oportunidade abençoada de participar ativamente da chegada de minha filha ao mundo e isso me doía muito, mas muito mesmo!! Eles todos me roubavam descaradamente algo tão valioso, impossível de ser mensurado, e eu ainda saía como a vilã da história, todos me olhavam com uma condenação no olhar (ou eu que me sentia condenada, já não sei.....)

Na hora de entrar no centro cirúrgico o anestesista ( meu Deus!!! Eu achei que jamais fosse precisar dele) falou para o Márcio esperar do lado de fora. AHHHH NÃO, ele entra se não eu não vou!!! Espera aí, vocês me roubam um momento mágico e único em minha vida e agora ainda querem que meu marido não participe!!! Aquelas pessoas todas me assustavam, tratavam tudo de forma tão impessoal, conversavam entre si como se nós (eu, minha filha e meu marido) fôssemos as figuras menos importantes naquele cenário.

Então empaquei ali na porta com meu marido e comecei a chorar mais forte ainda, sentindo aquela dor estranha, para a qual eu não estava preparada. Não havia alívio para aquela dor que sentia, não tinha posição, respiração ou recurso que ajudasse, era desesperador. E o anestesista me chamando, dizendo que tinha que ser rápido para eu entrar logo, mas eu não quero, eu não quero entrar aí, que droga, será que ninguém pode me dar um tempo, pelo menos para eu digerir essa idéia!

Aiiiii, mais uma vez aquela dor de não ser respeitada, ninguém se compadecia do meu sofrimento. Pode parecer exagero falar assim, mas não é. Eu realmente sofria muito naquele momento e ninguém foi acolhedor, ninguém parecia me entender ou querer me entender, todos só queriam correr e fazer tudo mecanicamente como já estão tão habituados!

Meu marido tentava me animar e me consolar, mas acho que ele também estava com medo e por isso também tinha pressa. Pressa que eu aceitasse logo entrar naquela sala com aquele anestesista e fazer logo essa cirurgia para que nossa filha nascesse logo e tudo terminasse logo.

Fui... me sentia derrotada, vencida, humilhada, era uma dor horrível. Quando entrei naquele centro cirúrgico todo e qualquer resquício de magia, beleza e serenidade que imagino que deva envolver um nascimento desapareceram!!! Tive que tomar anestesia, a maior de todas as dores pois era a sinalização mais evidente de que a partir daquele momento eu não significava e não podia mais nada!!! Dar a luz a minha filha já não me pertencia mais! Eu era uma mera máquina orgânica a qual seria aberta e de onde eles retiraram uma outra máquina, só que uma miniaturazinha!

Para a coisa ficar ainda menos humanizada eles sobem um pano na nossa cara e te mandam ficar com os braços estendidos (ainda me embrulha o estômago de lembrar)! É tanta luz, tanto pano verde, tanta gente que você nunca viu, tanta conversas entre eles, tanta impessoalidade, tanta falta de respeito, tanto desconhecimento do significado no nascimento! Minha vontade era gritar, mas eu já não conseguia mais, e então senti a dor da impotência. “Se pudesse sairia correndo e ganharia minha filha sozinha, no meio do mato”, eu pensava. Sozinha nada!!!! Nenhuma mulher está sozinha na hora de parir, todas as forças da Natureza estão ao seu lado, há uma falange de bons espíritos a auxiliá-la, tudo conspira a seu favor, mas infelizmente nosso sistema de saúde não comunga desta opinião.

Só recobrei um pouco de paz quando vi o Márcio se aproximar de mim, deu um segundo e ele falou, NASCEU. Ai meu Deus, como eu chorei... era um misto de vitória com derrota, de alegria com tristeza, de mágico com mecânico!!! Trouxeram nossa filha para nós e eu não conseguia falar nada só chorar, chorar e chorar. Meu marido então não tirou mais a mão dela, eu não conseguia segurá-la, levá-la ao meu peito e dar-lhe de mamar como tinha imaginado. Minha filha, concebida e gerada por mim, mas que não pude vê-la chegando ao mundo, nem meu marido ajudando a cortar o cordão como era meu desejo e isso ainda me doía muito, mas tinha também a gratidão de saber que ela estava ali.

Foi tudo tão mais rápido e doloroso do que eu tinha imaginado. É muito difícil você falar sobre isso porque todos usam o jargão “o importante é que o bebê está bem, ela está aí, viva, linda, saudável, é isso que importa”. Depois de passar por toda essa frustração você ainda tem que se contentar com essa explicação!!! Parece que continuar a se indignar e questionar é ingratidão com a vida que me deu uma filha tão maravilhosa. Mais uma vez o sistema de saúde e a nossa sociedade te levam a crer que você tem que aceitar, que é assim mesmo, parto normal é muito difícil, quase impossível de acontecer, é muito arriscado e perigoso.... Bem, tudo isso causa uma tremenda confusão emocional em nós mães, que já não sabemos mais o que sentir ou como pensar. Não é à toa que demorei quase um ano para conseguir falar abertamente sobre isso.

Continuo a acreditar que meu parto poderia ter sido normal e que minha filha estava bem, prova é que a tal nota que eles dão ao bebê quando nasce (APGAR) foi 9 e9. Dentro de toda a confusão de sentimentos que se apoderaram de mim a única coisa que não consegui sentir foi raiva da minha médica. Sei que ela fez o que pode, o que sabia o que conseguia fazer. Verdade seja dita, o problema é justamente esse, nossos médicos (salvo algumas exceções, que eu mesma ainda não conheço....) não sabem ajudar uma mulher a parir. Eles não aprenderam isso e nem são incentivados a tal. Eles não conseguem deixar que a natureza faça seu trabalho, que a mulher assuma o controle de seu corpo e que a vida surja de forma natural. Sou grata a minha médica por ter me tirado minha filha, mas não me contento mais com o que ela tem a me oferecer, nem ela, nem os outros médicos, nem as enfermeiras, nem os hospitais.

Hoje consigo dizer, ainda em voz baixa, que meu parto foi uma experiência dolorosa e traumática, mas nem por isso minha filha deixou de ser a coisa mais linda que aconteceu na minha vida! Fiz este relato, em primeiro lugar por mim, para me ajudar a superar essa cicatriz que ainda dói, e também para exemplificar às outras mulheres grávidas o quão árdua é a luta das que querem parir seus filhos. Que elas não se deixem iludir como eu, achando que seus médicos realmente são favoráveis ao parto normal e que os hospitais hoje estão preparados para isso. Que elas sejam fortes e decididas, que busquem se informar, que façam yoga, tenham uma doula e não precisem de hospitais para terem seus bebês.

15 comentários:

  1. Cara Doula,
    Parabéns pelo blog e por esse belo trabalho. As emanações de carinho, para cada um dos bebês que voce acompanha durante o nascimento, são gotas de luz e paz que os acolhe.

    ResponderExcluir
  2. Oi Inês como vc também passei por uma cesárea. Depois pari meu filho num lindo parto domiciliar.
    Penso que relatar ajuda a aliviar um pouquinho a dor do não vivido.
    Conheci vc na oficina da Naoli.
    Muito legal seu blog.
    Beijos!

    ResponderExcluir
  3. Olá! Sou psicóloga e mãe de um menino de 1 ano e 2 meses. Identifiquei-me bastante com seu relato de parto e fiquei até pensando se não seria a mesma médica e hospital de tão semelhantes que foram os procedimentos adotados (p.ex., uso da cadeira de rodas, ser separada do marido no pré-parto). A diferença é que eu não estava tão bem informada sobre os procedimentos indicados para o parto normal. Assim, depois de tomar ocitocina e ter a bolsa rompida com apenas 4 cm, sentir dores terríveis sem, supostamente, a dilatação aumentar, acabei "optando" pela cesárea, mas até hoje penso que poderia ter sido um parto normal se houvesse o real interesse e orientação da equipe médica...
    Moro no interior do Paraná e estou buscando informações (e formação) para montar um curso preparatório para gestantes e pais. Você saberia me dizer se há algum curso de formação de doula em Curitiba? Vi que sua formação foi em SP, mas se tiver surgido algum curso no PR neste meio tempo, seria o ideal... Se quiser "trocar figurinhas" sobre o assunto, meu email é: fermfpinheiro@gmail.com

    ResponderExcluir
  4. oi Ines, muito lindo e emocionante teu relato, infelizmente muitas mulheres teem sido iludidas e enganadas...mas o trabalho que fazemos...eu , vc,...enfim, é somente apartir de um grande movimento nosso...mulheres é que as coisas mudam. !!! Bjo grande adorei te conhecer!!

    ResponderExcluir
  5. Chorei ao ler seu relato. Pude relembrar claramente o que fizeram comigo,tudo foi muito parecido. E foram quatro cesareas para minha frustração. E eu tb continuo a acreditar que meus partos poderiam ser normal..e até hoje dói pensar nisso. Vc é iluminada !!!

    ResponderExcluir
  6. olá
    Eu encontrei esse blog, pois eu estou a procura de varias Doulas em curitiba..
    Minha historia foi igual a sua, tive minha filha, assim desse jeito.. parece q até as suas palavras sao da minha boca.
    Me dói mto o nascimento da minha primeira filha, aquela coisa especial foi arrancada de mim, e me sinto ferida até hoje.. nao sei quando vai passar.
    Só sei q agora, planejo ter o segundo, mas antes disso, vou pesquisar e muuuuuuuuuuuuito.. vou fazer td planejado.. Hospital, tá fora da minha realidade agora.
    Me doi tanto pensar nisso.. todo dia quase eu penso nisso. Ta aqui, guardada e ferida dentro de mim.
    ABraços.

    ResponderExcluir
  7. Olá Querida, realmente não fácil lidarmos com essa sensação e com essa dor. Mas a cada vez que me vem um pouco de tristeza tento reagir e pensar o que a vida pode me ensinar com esta experiência!
    O que posso te dizer é que estamos aqui para o que precisar. Estude mesmo, pesquise mesmo, fortaleça sua autoconfiança. Isso é tudo que podemos fazer e tenha certeza - é bastante!
    Quando quiser me envie um e-mail com seu telefone para conversarmos sobre nossos encontros e aulas para gestantes.
    Grande abraço,
    Inês Baylão - 41 9102.7587 / inesbaylao@yahoo.com.br

    ResponderExcluir
  8. Oi Ines!! Nossa me emocionei e me ajudou muito ler seu relato, também estou tentando escrever sobre o meu, o sentimento foi o mesmo. Mas cmo a Pat (Bortolotto) me disse, pelo menos eu fui preparada pra isso,pois tive que marcar a minha pq eu estava com 42 semanas e nada de nada de acontecer. O meu colo estava super fechado, duro e o Kayan super alto. Mas não sei o que é pior, pois nem o prazer de ter entrado em TP eu tive, de ele ter escolhido a hora dele. Acredito ainda que ele nasceria no dia seguinte de parto normal. Me senti totalmente frustrada como mulher, apesar de estar realizada como mãe. Sei bem o que você sente tbem. ter me preparado com a Talia, lido muito, conversado ... enfim. Vendo por outro lado, aprendi e aprendo muito com isso também. acredito nada ser por acaso.
    Como tenho plena confiança no Dr. Carlos, me ajuda um pouco, mas ainda penso na música "que tu virias numa manhã de domingo, não duvido já escuto seus sinais..." (ele nasceu em um sábado)!!!
    E tbem n suporto ouvir "o que importa é que ele esta aí, bem e saudável"!!!
    Que possamos parir no próximo né?!!!!!
    beijos
    Amanda

    ResponderExcluir
  9. Oi Ines querida! Fiquei emocionada como seu relato. Apesar de ter sofrido tanto, tenho certeza que és muito iluminada e vais superar e aprender muito com esta experiência. Desejo de coração que seja uma DOULA especial, ou melhor, já és! Beijão amiga, fica com Deus! Saudades,
    Lorenice

    ResponderExcluir
  10. Olá Ines, lindo e importante seu relato. O cenário muda mas a história é a mesma.Passei por maus pedaçoes para ganhar meu filho mais velho,mas graças a Deus, hoje tenho 3 filhos e todos meus partos foram naturais. O parto é o momento mais lindo e mágico na vida de uma mulher.

    ResponderExcluir
  11. Ines, leio seu relato agora, 2 anos depois, e lembro do parto do meu 1o. filho. Foi igual ao seu até o ponto em que a médica falou com 40 semanas que era melhor fazer a cesárea, me botou medo, falou que eu 'não tinha dilatação' (odeio essa médica com todas as forças hoje que sou mais informada) e eu aceitei. Por medo. Ela manipulou meus sentimentos. Ela disse "posso colocar voce no soro com um remedinho - ridicula - mas voce pode sofrer e o bebe também". Ela queria era fazer a cirurgia ! No 2o., eu ainda tão mau informada, não sabia que era possivel um parto normal após uma cesárea, continuava assustada e acreditando no benefício da cesárea. Mas não sofri com essa violência, veja bem, porque eu não entendia assim ! Eu achava certo ! Bom, hoje melhor informada, tento conversar com as grávidas que conheço, orientando para pensarem no parto natural. É isso. Bjs !

    ResponderExcluir
  12. Também me identifiquei bastante! TIve 2 filhos de parto normal (porque quis e tive dificuldade em achar médicos que não me convencessem do contrário. O sistema hospitalar Brasileiro tem respeito ZERO pela mãe e pelo parto. A impressão que tinha é que todos que me atendiam tinham raiva de mim por estar insistindo em parto normal, sendo que o "normal" hoje em dia é cesariana. Estou grávida do terceiro e só de pensar em ter que enfrentar todo o descaso e grosserias que encarei no hospital na hora do parto, me faz pensar me fazer uma cesariana de uma vez... Mas não é o que acho o melhor para mim... Gostaria de saber mais sobre seus serviços e como funciona. Quais são os custos, etc. Agradeço se me responder! Obrigada e parabéns pelo blog!!!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi Raquel Amaral, que bom receber sua mensagem!!! Você pode sim vivenciar uma experiência totalmente diferente neste terceiro parto, nós já temos bons hospitais é médicos aqui em Curitiba para te atender. Sobre meu serviço, prefiro que me mande um e-mail e assim eu te respondo em particular - ines@diariodeumadoula.com.br
      Você já deu uma lida na parte aqui do blog que fala sobre mue atendimento? Aguardo seu contato! Beijo grande, Inês.

      Excluir
  13. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  14. Oi Inês! Sempre leio sobre relatos de parto, tb sou de Curitiba. E o que venho percebendo ao longo de quase 2 anos lendo relatos de parto, é que me parece que o "segredo" é esperar até o máximo do máximo para ir ao hospital. Pq ai, realmente se estiver parindo, eles ( profissionais ) não tem muito tempo de pensar em cesária, correm com exames e papelada e quando veem o parto normal já está acontecendo. Posso estar enganada, mas venho percebendo isso.
    Outro exemplo de parto normal é o SUS, ele parece nesse sentido mais humano que convênios ou particulares. Pois realmente só internam quando as gestantes já estão parindo mesmo. E mesmo que ainda não estejam parindo, eles deixam a gestante lá na maca "com dor" e tb sem atenção. Mas que nasce de parto normal nasce!

    Pelo seu relato, vc me parece ser de fato teimosa, não digo para ofender, e tem uma enorme personalidade e muito forte, tb sou assim. Eu nunca quero perder o controle das coisas, e pelo relato me pareceu que ao perder o controle, sua frustração foi tamanha que perde-se nesse instante um pouco inclusive da sensatez, o que é normal por o desejo ser muuuuito grande.

    Se vc tivesse um mato para parir, creio que no dia seguinte com muita dor teria parido. Mas vc não tinha mato, nem em casa ( o que acho que foi ruim para vc ) nem no hospital, nem com sua médica que parece muito boa, mas teve medo que algo ocorresse com sua Laís, e nem com seu esposo que tb esteve no final bastante inseguro, e tentando ficar entre a sensatez e seu desejo de parir.

    Vc disse " não sabem ajudar uma mulher a parir. Eles não aprenderam isso e nem são incentivados a tal. Eles não conseguem deixar que a natureza faça seu trabalho, que a mulher assuma o controle de seu corpo e que a vida surja de forma natural" Isso é a mais pura verdade! a frase é perfeita!

    para isso teriam que estudar mais 6 meses só essa matéria na faculdade e mais 6 meses de estágio nesse setor.

    Espero que meu comentário não te deixe furiosa com algo que possa ter escrito.
    Sinto que sente muita dor, e espero que consiga, se é que ainda não conseguiu. Deixar tudo isso cicatrizar, pois Deus tb sabe quando intervir através das mãos de um médico.

    Acredito que se estivesse sozinha em casa, teria sido um pouco diferente essas dores todas! Não entendo tanto quando vc, nem de longe.. mas quem sabe fica essa humilde dica para um possível segundo filho, se vier a ter.

    Enorme abraço!
    29/04/2014

    ResponderExcluir