segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Parir pode ser gostoso, nascer pode ser amoroso, e a vida pode ser mais suave...

Este é o relato de parto de uma grande amiga.
Amiga que fiz nesta caminhada de compreensão e entendimento a respeito da experiência de parir e maternar.
Mônica demonstra neste lindo texto o caminho que percorreu entre os nascimentos de suas duas filhas. E nos conta de forma doce todo seu processo de aprendizado e transformação.

Obrigada, querida amiga, por permitir que eu compartilhasse aqui sua experiência!



RELATO DO PARTO DA ESTELA

Na verdade, este relato começa com o nascimento da minha primeira filha, Olivia.

Olivia nasceu de um parto normal hospitalar muito rápido, de pouco mais de 1 hora, onde ocorreram todas as intervenções possíveis (indução com ocitocina, analgesia, bolsa rompida artificialmente, fórceps de alívio, episiotomia e por aí foi).

Para a consciência que eu tinha na época, foi um parto excelente e uma experiência emocionante e inesquecível. Minha pequena nasceu super saudável, mas ficou poucos minutos perto de mim no centro cirúrgico, pois foi rapidamente levada pelo pediatra enquanto eu ficava em observação em uma sala de recuperação. Nos encontramos novamente mais de duas horas depois.

Quando chegamos em casa, meu marido me mostrou um vídeo que ele fez durante este tempo em que Olivia esteve longe de mim. O vídeo mostrava minha pequena, que tinha acabado de sair da minha barriga, sofrendo uma série de intervenções de todas as espécies. Pesa, mede, injeta alguma coisa, vira daqui, vira dali. Olivia estava aos berros, com os bracinhos e perninhas para o ar, tremendo, como que implorando por socorro. E eu estava só, em uma sala perto dali, sem saber o que estava acontecendo com a minha bebê.

Ver aquilo foi um choque enorme para mim e explodi em lágrimas. Como aquilo podia ter acontecido? Ela devia estar comigo, mamando, e não passando por tudo isso, com estranhos, nos seus primeiros momentos de vida. Nunca mais consegui assistir a este vídeo e fico com um nó na garganta cada vez que me lembro disso.

Como nada acontece por acaso, esta experiência me impulsionou a pesquisar mais sobre o nascimento e sobre a forma como os bebês são tratados quando nascem. E então um mundo novo se descortinou. Mergulhei em todos os sites que falavam sobre o assunto, li todos os livros que pude, fiz cursos e conheci pessoas (reais e virtuais) que me mostraram que o nascimento não precisa e não deve ser tratado desta forma violenta. E, mais importante, descobri que a forma como se nasce pode ser determinante para toda uma vida e, por que não, para toda a humanidade. Neste tempo de estudo, adquiri muita informação e pude entender todos os procedimentos que eu e minha pequena sofremos no parto, e percebi que o aconteceu conosco não é considerado anormal ou violento ou ruim, mas é a rotina padrão de todos os partos hospitalares (inclusive os "normais").

Além de tudo o que aprendi, fui também mudando minha consciência em relação a assuntos como a gestação, o parto e a maternidade e isto resultou em uma transformação real de hábitos e valores para mim e para a nossa família. Dividi este caminho que estava percorrendo com o meu marido e fomos moldando um novo jeito de exercer a maternidade e a paternidade (de viver, até), talvez muito diferente do que seria se isto não tivesse acontecido.

Minha segunda gravidez foi muito desejada. Queria muito dar um irmão para a Olivia e também poder viver uma nova gestação de uma forma diferente e mais consciente. E posso dizer que vivi intensamente esta experiência desde a concepção da Estela. Desta vez, eu estava muito mais preocupada em estar sempre conectada com o meu bebê e comigo mesma do que com exames, rotinas médicas ou roupinhas de bebê. Eu queria viver plenamente esta gravidez. Pelo lado prático, busquei um médico que pudesse acompanhar o meu pré-natal da maneira menos intervencionista possível. Logo que descobri que estava grávida procurei o Dr. Claudio Paciornik, que desde o início foi receptivo com os meus planos de gestação e partos naturais. Disse pra ele, já na primeira consulta, que queria ter um parto em casa e que buscava um médico que, se não fosse me ajudar com isso, que ao menos não me atrapalhasse (hehehe). O Claudio sempre foi muito atencioso com todas as minhas vontades e sempre respeitou minhas decisões, como fazer o mínimo possível de ultra-sons (foram apenas dois, um na 13a. semana e outro na 22a.). Conversávamos muito durante as consultas mas eu ainda não tinha me planejado sobre como seria meu parto domiciliar.

Participei dos encontros de gestantes do Aoba durante toda a gravidez e, num desses encontros, a Luciana (que é doula e coordenadora do Espaço) me indicou a Adelita, uma enfermeira obstétrica que atende partos domiciliares aqui em Curitiba. Liguei para a Adelita e ela veio até nossa casa para conversarmos melhor. Foi empatia à primeira vista! Além de ser super qualificada, Adelita se mostrou totalmente sintonizada com as razões de escolhermos um parto em casa e nos explicou com muita clareza como tudo poderia acontecer. Também nos avisou que, provavelmente estaria em uma viagem no período do nascimento da Estela, mas nos tranqüilizou contando que ela trabalha em um grupo de três parteiras e que elas se revezam, caso alguma não estejam presente. Depois disso, conhecemos a Maria Rita e a Aline e a sintonia foi a mesma. Tínhamos encontrado nossas parteiras!


Encontro de pré-natal com a Maria Rita (e a assistente Olivia)

A partir da 36a. semana começamos o pré-natal com elas, que vinham à nossa casa uma vez por semana para escutar o coração do bebe, checar se a gestação estava correndo bem e saudável e, principalmente, para conversarmos sobre a gravidez e planejarmos o parto. Adorava as visitas de pré-natal, pois era um evento em que toda a nossa família participava. Adorava ver minha pequena Olivia, então com 2 anos, usando o estetoscópio para ouvir o coração da irmã. Meu marido podia tirar todas as suas dúvidas e, tomando um prato de sopa juntos, conversávamos sobre o parto. Me senti super à vontade para colocar todos os meus desejos e restrições e discutimos juntos todos os detalhes. A visita mais incrível foi quando fizemos um "ultra-som" colorido da Estela, uma linda pintura na minha barriga que rendeu fotos incríveis!



Ultrassom colorido da Estela
No dia 26 de junho de 2011, Maria Rita e Aline vieram até a nossa casa para mais uma consulta. Contei a elas que estava com muitas contrações, mas sempre fora de ritmo. Elas vinham e iam, alguns dias mais e outros menos. Tinha certeza que já estava com alguma dilatação, mas preferimos esperar uns dias para ter certeza disso, já que a minha aposta era de que Estela chegaria na próxima virada da Lua Nova, no dia 01 de julho. Maria Rita fez alguns exercícios comigo para alongamento usando um reboso e o Cris ajudou com uma massagem nas costas. Elas saíram de casa no início da noite e eu fui jantar e acomodar a Olivia para dormir. Estava insone e não conseguia relaxar de jeito nenhum. Comecei a me sentir insegura sobre como seria minha vida com duas crianças, preocupada em como poderia dar atenção para duas pequeninas e acabei indo para o sofá da sala para tentar dormir. O reboso que a Maria Rita usou ainda estava sobre o sofá e fazia muito frio de madrugada. Então me enrolei nele e decidi que não ficaria mais insegura, pois eu sou a mãe dessas pequenas e saberia como fazer para dar o meu melhor para elas. Finalmente dormi.

Acordei um pouco antes das 7h sentindo uma dorzinha diferente. O Cris chegou na sala logo em seguida e deitou do meu lado. Comentei com ele que estava com uma cólica esquisita e que estava um pouco ansiosa para terminar de arrumar as coisas para a chegada da Estela, pois faltava menos de uma semana. Ele prometeu me ajudar no que precisasse e dividimos tarefas. As cólicas continuaram e comecei a perceber que elas vinham e iam em intervalos freqüentes, de mais ou menos 20 minutos cada. Passei a manhã toda assim e resolvi então agilizar as coisas. Eu e a Su, uma querida ajudante que trabalha em nossa casa há algum tempo, finalmente arrumamos as roupinhas da Estela no armário e deixamos suas coisinhas prontas para quando chegasse. Durante o almoço comentei com o Cris que as cólicas estavam mais freqüentes e resolvemos marcar os intervalos. Estavam de 10 em 10 minutos. Eu ainda não achava que poderia ser o trabalho de parto pois, apesar de super ritmadas, as contrações eram perfeitamente suportáveis e a sensação sumia totalmente nos intervalos, quando eu ficava muito bem.

A tarde correu normalmente e tirei um cochilo com a Olivia depois do almoço. Apesar das contrações continuarem no ritmo e com sensações cada vez mais intensas, consegui descansar bastante e acordei com vontade de comer um doce. Resolvemos fazer brigadeiro para comer de colher e a Olivia se divertiu bastante com a sua panelinha. Respirava entre as contrações enquanto comia uma colher de brigadeiro, hehehe. Aproveitei também para fazer um creme de Aromaterapia para o parto, com óleos essenciais de Lavanda e Jasmim. Minha mãe passou em casa e eu tentei disfarçar o que estava acontecendo, pois não queria avisar ninguém para que não ficassem preocupados. Esta foi a parte difícil pois é quase impossível enganar sua própria mãe (ela me disse: "tô achando você meio arriadinha hoje…"), hahahahahaha. Ela foi embora desconfiada e então eu resolvi sentar na bola, pois a sensação das contrações já era bastante intensa e os intervalos estavam cada vez menores. A Su iria embora às 18h e então eu percebi que não tinha condições de ficar sozinha com a Olivia. Liguei pro Cris e pedi que ele viesse mais cedo pra casa. Mesmo assim, ainda não acreditava que estava em trabalho de parto e, apesar da Su ter insistido em ficar, pedi a ela que fosse pra casa pois eu achava que ainda podia ficar com aquelas "cólicas" mais uns dias.

Brigadeiro de colher durante o trabalho de parto

Quando o Cris chegou eu estava brincando com a Olivia, mas as contrações já estavam bem fortes, com intervalos de 5 em 5 minutos. Resolvi esquentar a sopa para nós jantarmos mas já não consegui comer, pois precisava me movimentar para aliviar a dor. Andava bastante pela casa e me ajoelhava ou acocorava quando as contrações chegavam. Resolvi então ligar para a Maria Rita para avisar que "talvez" eu fosse precisar delas durante aquela madrugada. O Cris ficou um pouco nervoso e acabamos passando esta ansiedade para a Olivia, que começou a ficar um pouco assustada. Então o Cris ligou pra Su e pediu que ela voltasse para ficar com a pequena, conforme tínhamos combinado. Deitei do lado da Olivia e contei uma historinha para que ela se acalmasse e ela ficou tranqüila de novo, mas eu já sentia muita dor e não conseguia ficar deitada. Então a Maria Rita me ligou de novo e, durante os poucos minutos que falamos no telefone, tive três contrações muito fortes e nem conseguia falar com ela. Ela me disse que estava vindo pra minha casa e falou pra eu entrar no chuveiro com a bola, para tentar aliviar a dor. Acho que só quando ela me falou no telefone: "Você está em trabalho de parto" é que caiu minha ficha de que esta seria A noite.

Fui então para o chuveiro e pedi ao Cris que ficasse com a Olivia e não se preocupasse comigo pois, apesar das dores, eu estava bem e o chuveiro era muito relaxante. Fiquei quase uma hora deixando a água cair sobre as minhas costas e, a cada contração, me ajoelhava sobre a bola e gemia, o que também me ajudava bastante a relaxar. Durante este tempo, a Su chegou e foi fazer a Olivia dormir e, em seguida, o Cris entrou no banheiro com a Maria Rita. Fazia poucos minutos que eu tinha me cansado no chuveiro e decidido sair. Acontece que as contrações estavam realmente fortes e freqüentes e eu já não conseguia mais ficar em pé. Fiquei em quatro apoios sobre o tapete do banheiro e o Cris e a Maria Rita me ajudaram a vestir uma blusa para que eu fosse para o quarto. Maria Rita sugeriu fazermos um toque mas eu disse a ela: "Não vamos fazer isso… Se você me disser que eu estou com 3 centímetros acho que eu morro". Estava realmente impressionada com a intensidade da dor que eu sentia mas como, ao mesmo tempo, ela era perfeitamente suportável se eu deixasse o corpo falar e agir. Procurava apenas seguir os sinais do meu corpo e deixar tudo acontecer. Aliás, senti que não tinha alternativa e que este era o único jeito de passar por aquilo.

Chegando no quarto, o Cris já tinha arrumado tudo conforme eu tinha pedido enquanto estava no chuveiro (edredom grande no chão, lençol descartável por cima, aquecedor ligado e as toalhas brancas por perto). Voltei aos quatro apoios sobre o edredom no chão enquanto a Maria Rita fazia uma massagem nas minhas costas e barriga com o creme de óleos essenciais. A cada contração eu me agarrava no Cris e soltava uma grande "Aaaahhhhh", que me ajudava a passar por elas. Durante uma contração bem forte a bolsa rompeu e senti aquele líquido quente caindo e escorrendo pelas minhas pernas. A Aline chegou logo após e se preparou para receber minha bebê, pois já estava no expulsivo. Para mim, esta foi a fase mais interessante do parto. Durante as contrações eu ficava de joelhos e, assim, sentia Estela descer cada vez mais e se encaixar no canal de parto. É impressionante como a percepção do corpo do bebê é nítida! Ela ia descendo e senti sua cabeça coroar. Foi então que eu disse: "Ela já está aqui!" e coloquei minha mão sobre sua cabecinha, sentindo seus cabelinhos. Nesta hora, sentia muita dor e também muita ardência, o tal círculo de fogo, mas me entreguei à sensação. Na verdade, percebi que eu não estava fazendo nada, mas que o parto simplesmente estava acontecendo a partir de uma ação espontânea do meu corpo. Me sentia mesmo como uma ursa, de joelhos, colocando meu bebê para fora do meu corpo. Eu me movimentava, emitia sons, abria muito minha boca e meus olhos, mas parecia que tudo acontecia sozinho, independente da minha vontade. Deixei tudo acontecer, não me preocupei em fazer nada e não tive medo.

Mais uma contração forte e de joelhos e a cabeça saiu. Na próxima contração senti seu corpinho escorregar para fora, o que foi até gostoso. Nesta hora, o Cris já estava atrás de mim e, junto com a Aline, recebeu nossa filha em seus braços. Estela nasceu às 21h56 do dia 27 de junho de 2011, a noite mais fria dos últimos 11 anos em Curitiba.

As dores cessaram instantaneamente e o Cris entregou nossa pequenina para mim. Não sei descrever o que eu sentia neste momento, pois conhecer minha pequena depois de tudo isso era uma mistura de algo forte e poderoso com uma sensação doce e singela, natural. Sentei sobre o edredom e coloquei ela no peito. Ela tinha os olhinhos bem abertos e, antes de mamar, olhava com atenção para a gente. Logo soltou seu primeiro chorinho e então mamou com vontade, sabendo o que estava fazendo. Ficamos todos ali durante muito tempo, na penumbra, vivendo aquele momento mágico.


Primeira mamada da Estela alguns minutos depois de nascer.

Cris cortando o cordão (sem flash, pra não estragar o momento).


Depois de uma hora e meia resolvemos dequitar a placenta pois eu já estava cansada de sentir dores e ela estava presa por uma membrana, demorando muito para sair. Então o Cris cortou o cordão, que já não pulsava há tempos, e a Maria Rita e a Aline pegaram a Estela para pesar e medir. Quanta diferença do tratamento dado no nascimento da Olivia! Estela ficou o tempo todo comigo, no quarto escurinho e quentinho, e foi delicadamente pesada e medida ("sem esticar muito", conforme eu pedi, hehehehe). A Aline revisou o períneo e viu uma pequena laceração, mas decidimos nem dar ponto pois não estava sangrando. Estela caiu em um sono profundo e então eu fui esquentar uma sopa para todos. Me sentia ótima e absurdamente feliz com tudo o que tinha acontecido.  Nossas parteiras deixaram nossa casa por volta das 2h da madrugada e eu tomei um banho e fui deitar com a Estela e com o Cris, no quarto em que ela nasceu.


Nossa Estrelinha.
Mas o melhor de tudo ainda estava por vir. O que aconteceu depois do parto foi algo realmente mágico. Na manhã seguinte, Olivia acordou e veio conhecer a irmãzinha. Ela ficou encantada e ficamos os quatro, no quartinho delas, curtindo nossa família que acabava de aumentar. O clima que ficou em nossa casa durante muitos dias era de uma paz absoluta. Me sentia em plena lua de mel, daquelas que você não quer que acabe nunca. Não sei explicar direito como foi tudo isso, mas parece que estávamos dentro de uma nuvem maravilhosa por mais de uma semana, com muito amor e delicadeza. Todos os que chegavam eram contagiados por isto e tomo o cuidado para nunca me esquecer desta sensação e para tentar reavivá-la sempre entre nós. Esta foi a luz que a nossa Estrelinha nos trouxe quando nasceu em nossa casa, recebida pelas mãos de seu pai, acolhida por sua mãe e muito festejada por sua irmãzinha.


Estela Lopes Stange, nascida em 27 de junho de 2011, as 21h56,
em nossa casa, na Rua Francisco Rocha, Curitiba.

Escrito por Mônica Lopes Stange.

3 comentários:

  1. Fiquei tão emocionada!!! Essa sensação de paz é realmente deliciosa e única, incrivelmente arrebatadora! felicidades pra família lopes stange! grande abraço

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  2. Meu Deus, que história linda, estou muito emocionada, obrigada por compartilhar isso com as pessoas! Não consigo parar de chorar, quero igual, é assim que nascer deve ser... Parabéns ao casal.

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